Valham-nos os avós

Estamos em pleno Verão, época que pode ser uma autêntica dor de cabeça para os pais de todo o mundo. A escola pública encerrou no final de Junho (ou até antes, para os anos que têm exames) e os colégios, salvo raras excepções, cerram portas durante todo o mês de Agosto. É verdade que há inúmeros ATLs e campos de férias, mas a maioria paga-se a peso de ouro, pelo menos na grande Lisboa onde cada semana disto ou daquilo custa em média 120 euros. Assim, os pais têm duas hipóteses: A) tiram todas as férias do ano para ficarem com os filhos durante todo o tempo em que a escola está encerrada. B) contam com os avós.

A hipótese A é bastante viável e inevitável para quem vive longe da família, mas a factura a pagar pode ser um internamento compulsivo na ala de psiquiatria. Um mês, vinte e quatro horas por dia, com os rebentos? Ninguém merece.

Se bem que tirar um mês de férias, para quem tem os filhos na escola pública não chega, pois as escolas encerram durante muito mais do que os vinte e dois dias úteis a que um trabalhador por conta de outrem tem direito. E temos de ter em conta que provavelmente já teve de tirar alguns dias no Carnaval, na Páscoa e nas inúmeras pausas lectivas que as escolas têm.  Também, quem é que vos manda ter filhos nos tempos que correm se não podem ficar com eles nos noventa e tal dias por ano em que as escolas estão fechadas? Porque é que não preferiram contribuir para a estatística que está a levar a que os europeus já só representem 7% da população mundial?

Os pais podem sempre ser criativos e tirarem cada um os seus vinte e dois dias em separado. Assim já dá quarenta e quatro dias. Não? Pois, não é grande ideia.

O que nos leva para a hipótese B: contar com os avós (ou tios, ou padrinhos), sem dúvida a melhor para as três partes envolvidas. Para os pais é um autêntico descanso, já que sabem que os filhos não podem estar melhor entregues e, além disso, não têm de pedir um empréstimo para pagar actividades de verão. Para os avós é uma alegria (pelo menos nos dois primeiros dias) e uma oportunidade para matarem todas as saudades dos netinhos e fazerem todos os castelos de areia que não tiveram tempo ou paciência para fazer quando os filhos eram pequeninos. Para os netos é uma maravilha.

Haverá coisa melhor do que passar férias com os avós? Ter sempre na mesa as comidas preferidas, ouvir histórias que já ninguém sabe contar, poder fazer as asneiras que os pais nunca deixam fazer? Algumas das melhores memórias da minha infância são as férias de Verão com os meus avós. No Algarve, onde íamos apanhar caranguejos nas grutas da praia de Armação de Pêra e jogas mini-golfe depois do jantar. Em Sesimbra onde ficávamos na praia até ao pôr-do-sol e brincávamos pela noite dentro, nas traseiras da casa com os amigos de verões anteriores. Na vivenda onde viviam, onde trepávamos às árvores e aprendemos a andar de bicicleta nas estradas de terra batida. Joelhos esfolados, nívea da bola Epá com pastilha a sério, lutas fratricídas, saudades da mamã, jogar à bisca. Que sorte a minha e a de todos os que puderam e podem contar com os seus avós para criarem memórias únicas. Que sorte os meus filhos por também terem avós que os levam em grandes aventuras, mesmo sem sair de casa.

Mas fica no ar a questão principal, em que todos devemos reflectir: e quem não os tem? Devem as crianças ser sobrecarregadas com escola para que o seu calendário se ajuste mais aos dos pais? Ou devem os pais ter mais flexiblidade laboral para poder ficar com os filhos ou trabalhar a partir de casa nos intervalos lectivos? Ou deve os Estado criar mais estruturas gratuitas para todas as crianças? Ou devem os salários ser mais elevados para que mais crianças possam usufruir de actividades de Verão pagas? É que cada vez vai haver menos avós disponíveis, porque também ele trabalham e muito. Uns porque ainda são muito activos e querem fazê-lo, outros por pura necessidade financeira. Quando se reformam (por este andar aos setenta) já não têm a mesma energia para tomar conta de netos. E aí cada vez serão mais as famílias que terão de escolher a hipótese A, que como vimos não é grande hipótese. Lá diz o ditado, é preciso uma aldeia para criar uma criança, mas as famílias vivem cada vez mais isoladas.

 

 

One thought on “Valham-nos os avós

  1. Sou avó e não me revejo nesse retrato de “avó-deixa-fazer-tudo” . Pelo contrário, tento uma refeição em família sem telemóveis, doces só depois da refeição snacks de fruta , um gelado por dia … devo ser uma avó muito chata.

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