O Presente de Natália

I

Era um fim de tarde frio e ventoso, numa pequena cidade portuguesa com ruas entupidas de carros e luzes. O sol há muito se pusera, culpa do horário de Inverno, que naquela altura do ano fazia com que José acordasse no escuro e no escuro regressasse a casa. As longas semanas durante as quais tal sucedia, costumavam deixá-lo mal-humorado, mas naquele dia, estava invulgarmente contente. O patrão dera a véspera de Natal, pelo que, na manhã seguinte, poderia acordar e banhar-se sem pressa na luz branca do dia. Saltou do autocarro e apressou o passo até casa, cuja fachada estava estranhamente despida de enfeites.

Não foi, porém, a escassez da habitual parafernália natalícia que fez José franzir o sobrolho. Antes a ausência do inconfundível cheiro das rabanadas. Natália fazia-as religiosamente no dia vinte e três, visto que, na véspera de Natal propriamente dita, os afazeres eram demasiados para poder estar de volta da enorme frigideira de ferro a fritar cada fatia até ao tom certo de dourado, ao mesmo tempo que mexia pacientemente a calda de mel e vinho do Porto. Chamou pela mulher, uma e outra vez, acabando por encolher os ombros perante o silêncio que obteve em resposta. Provavelmente tinha ido fazer umas compras de última hora, pensou. Para Natália havia sempre mais qualquer coisa para comprar. Umas tostinhas para acompanhar o queijo, uns berloques para pendurar nos guardanapos, um chocolatinho em forma de Pai Natal para fazer sorrir os netos… Estaria em casa não tarda. Trocou os sapatos pelas pantufas, desapertou as calças e refastelou-se na sua poltrona a ver televisão.

Pelas nove da noite, terminado que estava o telejornal, José foi até à cozinha procurar qualquer coisa para comer. Seria possível que a mulher não lhe tivesse deixado o jantar pronto? Abriu a porta do frigorífico, meio vazio, e vislumbrou um tupperware com sopa de há três dias. Na caixa do pão sobravam umas fatias um pouco secas e no armário encontrou um queijo por encetar. Aquilo não era o jantar que tinha em mente, mas teria de servir. E Natália que tinha o telemóvel desligado e nunca mais chegava. Maldisse a vida. Voltou para a poltrona, ignorando um certo alarmismo que se apoderava dele, e adormeceu a ver um daqueles programas com muitos convidados entendidos acerca de todo e qualquer assunto, enquanto as paredes tremelicavam com as luzes da árvore de Natal. Acordou sobressaltado às cinco e quarenta, o pescoço dorido de ter dormido sentado. Dirigiu-se ao quarto, convencido de que Natália teria, entretanto, chegado, mas encontrou a cama intacta, o que o deixou verdadeiramente preocupado. Onde se teria metido a mulher? Teria tido um acidente? Teria sido raptada? Ligou primeiro para os hospitais, depois para os bombeiros, mas ninguém tinha qualquer informação para lhe dar. Respirou fundo, bebeu um copo de água com açúcar e ficou a olhar para o relógio, à espera de que batessem as sete para poder ligar à filha. Estela atendeu o telefone ofegante.

­— Sim, pai?

— Estela, querida, interrompi alguma coisa? – perguntou José, hesitante. Não era a primeira vez que a filha atendia o telefone em situações muito impróprias.

— Não pai, estou a correr na passadeira, diz lá – despachou ela.

— Não sei da tua mãe.

—Como assim, não sabes da mãe?

— Ontem, quando cheguei a casa ao final do dia, a mãe não estava e não voltou a aparecer desde então. Já liguei para os hospitais, para os bombeiros, até para o grupo de voluntariado e nada.

— Ó pai, calma. A mãe não desapareceu assim, sem mais nem menos – afirmou Estela. — Pensa lá se não te disse onde ia. Tu não ouves metade do que ela te diz.

— Eu sei, mas acho que ter-me-ia lembrado. Além disso, é Natal, a tua mãe adora o Natal, onde é que se teria metido numa altura destas?

— Precisamente! Olha, eu tenho três reuniões hoje de manhã, mas assim que me despachar vou para aí – assegurou Estela.

— E o que faço até lá? Chamo a polícia?

— Não, credo, que exagero. Ela só pode estar a preparar alguma surpresa, sabes como ela é. E agora tenho de desligar que estás a estragar-me a média das pulsações. Tcha-au!

E desligou, deixando José pensativo. Estaria Natália realmente a preparar uma surpresa para a família? Na verdade, conseguia imaginá-la a esconder-se todo o dia e aparecer à meia-noite, carregada com um saco vermelho repleto de presentes, como se fosse a Mãe Natal. Era bem possível. Nunca conhecera ninguém com tanto gosto pela quadra. Em Outubro já andava pela casa a cantarolar canções natalícias e nunca aguentava até Dezembro para ter cada divisão decorada, incluindo as casas-de-banho, que não escapavam às fitas de azevinho enroladas à volta do espelho e Pais Natal sorridentes em cima do autoclismo. Tomou um duche, bebeu um café e ficou a contemplar o amanhecer sentado na poltrona, tentando afastar a crescente preocupação. Era a primeira vez em quarenta anos de casado que desconhecia o paradeiro da mulher. Natália era uma mulher de hábitos e nunca deixava de avisar onde ia e quando pensava voltar. Caso se atrasasse, ligava logo ou deixava recado. Ademais, era a responsável por toda a logística do Natal. Do menu, à decoração, da música aos presentes. Desde a manhã do dia vinte e três, até à noite do dia vinte seis, lá andava Natália, de avental com renas e um guizo pendurado, a cirandar pela casa, escada acima, escada abaixo, lava, limpa, cozinha, embrulha, apanha, arruma. Mas Estela estava certa. Não havia razão para alarme.

 A meio da manhã, quando lhe deu a fome, José lembrou-se de que, na véspera, não encontrara muito que se comesse. Talvez fosse melhor dar um pulo ao supermercado para comprar alguma coisa. Os filhos não tardariam a chegar e não podia apresentar-lhes uma mesa completamente vazia. À saída, reparou que Natália tinha deixado as chaves na taça de madeira do móvel da entrada e o casacão cinzento, que não largava por nada apesar de puído e de não lhe favorecer as formas roliças, pendurado no bengaleiro. Ficou um pouco mais aliviado. Se ela deixara as chaves e o casaco, é porque não tinha ido a nenhum lado. Definitivamente tratava-se de uma partida.

Após meia hora de trânsito para chegar ao shopping e outra meia para conseguir estacionar, José entrou no supermercado e sentiu-se desnorteado, pois nunca ali tinha entrado sozinho. Normalmente ia com Natália e limitava-se a empurrar o carrinho por onde ela lhe indicava. Ela sabia exactamente em que corredor e em que prateleira estava cada ingrediente de que precisava, deslocando-se pelo espaço como um soldado numa missão. Sem Natália para orientá-lo, José não sabia sequer por onde começar. Decidiu-se pela secção das bebidas. Sim, álcool. Ora aí estava uma coisa que sabia comprar sem a ajuda da mulher. Escolheu cinco garrafas de tinto mais duas de espumante e continuou a percorrer os corredores lotados, um por um, enchendo o carrinho com tudo o que lhe parecia familiar num mesa de Natal. Levou uma cesta de frutos secos, um pão e uma broa de milho, bolachas para as crianças, com e sem recheio, com e sem pepitas, com e sem açúcar, pois não fazia a mínima ideia do que os netos gostavam, umas latas de conservas, uns pêssegos em calda porque adorava e Natália nunca o deixava comprar, uma embalagem de enchidos em promoção e umas refeições congeladas, para o caso de a mulher não chegar a tempo para cozinhar a ceia.  Na interminável fila para pagar, ainda se lembrou de agarrar em alguns chocolates, um bolo-rei demasiado cozido e umas garrafas de Coca-cola, e ali ficou durante demasiado tempo, atordoado com a música natalícia vários decibéis acima do recomendado, gritos de crianças a fazerem birras no corredor dos brinquedos, casais a pegarem-se porque levavam coisas de mais ou coisas de menos, desconhecidos a discutirem pelo lugar na fila, uma voz nasalada constantemente a dar indicações pelos altifalantes.

Chegou a casa com a cabeça a latejar, mas esperançoso de encontrar Natália na cozinha, atarefada com as couves e a aletria, os queixumes acerca da trabalheira que aquilo dava abafados pelo exaustor, os rolos na cabeça, pois não tinha tido tempo de ir ao cabeleireiro. No entanto, a casa continuava vazia e o telemóvel desligado. Pesaroso, arrumou as compras com a sensação de que não estava a colocar as coisas nos sítios certos e foi à procura de um remédio para as enxaquecas. Onde é que Natália o guardava?

Pouco depois o telefone tocou e José correu para ele sobressaltado.

— Natália?

— Não, pai, sou eu, o Nicolau. Estou farto de ligar para a mãe, mas ela deve estar sem bateria – disse o filho.

— Pois, eu também…

— Era para saber se posso deixar aí os miúdos, para eu e a Carina termos umas horinhas de descanso esta tarde.

— Poder podes, mas a tua mãe não está – informou José.

— Como não está?

— Não sei dela desde ontem.

— Mas só agora é que me dizes uma coisa dessas? – indagou Nicolau, estupefacto.

— A tua irmã achou que não era caso para me preocupar.

— A minha irmã é mas é parva. Vamos já para aí.

II

Nicolau chegou a casa dos pais quase ao mesmo tempo que Estela, duas horas depois do telefonema, que isto de sair de casa com três crianças pequenas leva o seu tempo. Ainda nem tinham cumprimentado José e já estavam os dois pegados, trocando acusações. Estela continuava a acreditar que tudo não passava de uma partida da mãe, mostrando-se visivelmente irritada por ter tido de sair do escritório mais cedo quando havia tanto trabalho. Como se não bastasse quase toda a equipa tirar a tarde da véspera de Natal e ter de fazer tudo sozinha. Já Nicolau, queria chamar imediatamente a polícia e participar o desaparecimento da mãe. José não quis ouvir. Eles que decidissem o que achassem melhor. Deixou-os a discutir e foi tentar desfrutar dos netos, Rosa, Violeta e Silvestre, enquanto estes não tinham começado aos pulos e aos gritos no sofá perante a passividade dos pais.  Não teve tempo para sequer aquecer o lugar, pois logo se ouviu a campainha.  Estela e Nicolau estavam a ligar para o irmão mais novo, na esperança de que ele desempatasse a decisão de alertar ou não as autoridades, e Carina, a mulher de Nicolau, estava sentada no chão, de pernas cruzadas e costas muito direitas, apertando as contas castanhas de um longo fio que sempre trazia ao pescoço, como se estivesse a rezar o terço. O olhar dirigia-se às crianças, mas era como se não as visse. Costumava zangar-se com Natália quando ela falava da nora com algum desdém, mas realmente agora via como a rapariga era esquisita. Contrariado, levantou-se em direcção à porta, acalentando por breves momentos a esperança de ser Natália quem tocava insistentemente. Afinal, tinha deixado as chaves em casa.

Não era. Deparou-se, sim, com a cunhada, o cunhado e os dois sobrinhos adolescentes. Estavam todos mais gordos desde que os vira no verão. Ou então era ilusão óptica, por estarem rosadinhos e inchados pelos casacos demasiado quentes para o Inverno português.

— Josélito, dá cá um abraço – gritou Aurora, como se ainda estivesse com os ouvidos entupidos do voo. — Onde está a minha querida irmã, onde está? Tenho de lhe dizer que isto não é decoração que se apresente — continuou, entrando pela casa dentro e olhando para todos os recantos. — Atão, nem uma grinalda na porta? Nem umas velas acesas? E onde está o centro de mesa que era da nossa mãe? Não me digas que se partiu, que me dá já uma coisa. Ó Natália! Onde estás tu, mulher? – berrou, dirigindo-se à cozinha.

Tó Mané, o marido, largou as duas malas no hall e pôs o braço por cima do cunhado.

— E que tal uma fresquinha aqui para gente, ãh?

— Ó pá, não é que me esqueci de comprar cerveja? Mas tenho vinho com fatura.

— Também serve.

Rafael e Frederico, sem tirarem os fones, passaram pelo tio cumprimentando com um aceno de cabeça e foram sentar-se no sofá, ignorando as crianças, que nesta altura já tinham começado a embirrar umas com as outras, por causa do canal dos desenhos animados, por causa do tablet, por causa do pé de um que invadia o espaço do outro.

— Como assim, desapareceu? – perguntou Aurora aos sobrinhos, assim que eles lhe contaram.

— Ninguém sabe dela desde ontem à tarde – explicou Nicolau.

— Mas as chaves e o casaco estão ali na entrada. É por isso que eu acho que está a preparar-nos uma surpresa – acrescentou Estela.

— Mas ia deixar a casa assim? Sem a mesa posta, sem a ceia preparada? – questionou Nicolau, esbracejando para a irmã.

— Sem a ceia preparada? – perguntou Aurora.

— Não há nada. Nem bacalhau, nem rabanadas, nem coisa nenhuma – afirmou Nicolau, exasperado. – Este ano não vamos ter Natal…

— Calma, não desesperem que eu fui às compras hoje – disse José, entrando na cozinha e mostrando, orgulhoso, as compras que fizera.

— Enchidos, enlatados e bolachas. A sério, pai? – comentou Estela, desprezando as suas escolhas.

— Também comprei bacalhau espiritual, que é só pôr no forno…

— Ai, não acredito que não vou comer o bacalhau cozido e as couves – choramingou Aurora. – Passo o ano inteiro a pensar nele. A minha irmã não me ia fazer uma coisa dessas.

— Ó filha, não temos couves, mas temos três frascos de chucrute. E as Spekulatius – disse Tó Mané, tentando dar algum alento à esposa.

— Boa, mais bolachas… – suspirou Estela, olhando para as tradicionais bolachas alemãs que os tios traziam todos os anos.

O telefone volta a tocar. José corre para atender na esperança de que seja finalmente Natália a explicar toda a situação. Os outros encostam-se a ele tentando ouvir a conversa, para logo se afastarem perante o seu gesto negativo com a cabeça.

— Tenho de sair num instante – informou José, vestindo o casaco o mais depressa que conseguiu.

— Então, quem era? – perguntou Aurora.

— Era do lar. Fecha daqui a meia hora e esqueci-me de ir buscar a minha mãe.

— Ah, já nem me lembrava da avó… – afirmou Estela.

— Não te preocupes que ela também não se deve lembrar de ti. Até já – despediu-se José, batendo com a porta.

— Bom, não me interessa o que vocês acham, mas eu não vou desistir de encontrar a minha mãe – assegurou Nicolau, tomando uma atitude. —Vou ligar para a polícia e é já!

III

A mãe de José não tinha Alzheimer, mas a cabeça ficava muitas vezes baralhada. Por exemplo, assim que chegou, dirigiu-se aos bisnetos com grande entusiasmo, achando que eram os netos. As crianças esquivaram-se dos seus beijos repenicados, o mais novo começou a chorar, assustado, ao que ela reagiu tentando suborná-lo com um chocolate. Carina, finalmente saiu do seu transe apenas para impedir a oferenda, explicando que «os chocolates são excitantes e não devem ser consumidos pelas crianças depois das três da tarde». José levou a mãe para a cozinha, antes que soltasse uma resposta menos simpática, e D. Laurinda comentou logo que ainda não cheirava a bacalhau.

— A esta hora já devia estar a cozer em lume brando. Ó Natália! – gritou, sentando-se no banco junto à janela.

— Ó mãe, então não lhe expliquei que a Natália não está? – lembrou José.

— Olhe avó, coma aqui um bocadinho de queijo e estes figos que estão uma maravilha – disse Estela, empurrando a tábua de queijo para a frente da avó, famosa pela sua insaciável gula, a ver se a distraía dos acontecimentos, não fosse a emoção fazer-lhe mal.

A campainha voltou a soar e todos se entreolharam. José correu para a porta, e desta vez, também não era Natália, mas sim dois agentes da polícia. Nicolau tomou as rédeas da conversa, explicando ponto por ponto o que tinha acontecido, não omitindo sequer pormenores como a enorme paixão da mãe pela quadra. Os polícias observaram o hall, confirmando que as chaves e o casaco de Natália se encontravam ali, e foram fazendo algumas perguntas acerca dos hábitos da desaparecida. Decidiram começar a busca por pistas na cozinha, a qual, segundo a família, era o local onde Natália passava mais tempo, usando a bancada como secretária, quando trazia trabalho para casa.  Os agentes entraram na divisão, perscrutaram o ambiente, fixaram um ponto na parede e depois olharam um para o outro, revirando os olhos.

— Os senhores têm noção do trabalho que uma esquadra tem na noite de Natal? – perguntou um deles.

— Claro, senhor agente, mas trata-se de um desaparecimento – respondeu Nicolau.

— Eu devia era multá-los por nos fazerem perder tempo – continuou o polícia.

— Como assim? — indagou Nicolau, surpreendido.

O agente apontou para o pequeno quadro de giz na parede ao lado do frigorífico, onde se lia «Fui de viagem. Volto dia 2. Boas festas e até para o ano! Natália». A letra inconfundível da desaparecida.

— Impossível! A mãe nunca viajaria nesta altura – exclamou Nicolau, indignado.

— E sozinha?  Nem pensar – disse José.

— Como é que não vimos o quadro? – questionou-se Estela.

— A mim não me contou nada… – lamentou Aurora, que se achava no direito de saber tudo acerca da vida da irmã.

— Mas viajar para onde? – perguntou Tó Mané.

O segundo agente aproximou-se da bancada onde estava um copo com canetas e um cestinho com papéis e revistas e pegou numa brochura reluzente de uma agência de viagens com várias propostas tropicais para a época de Natal e Fim-de-ano. Entregou-a a José e preparou-se para sair.

­— Eu sabia que ela tinha feito isto de propósito — disse Estela, enfurecida.

Não bastava ter de interromper toda a sua vida para participar na festividade mais irritante do ano, e agora ainda tinha de levar com a gracinha da mãe, a fazer aquilo que ela própria sempre quisera fazer nesta quadra. Ai de ti que não venhas. Não vais dar um desgosto desses à tua mãe. Logo na altura mais importante do ano. O Natal para mim é sagrado. A família é o mais importante. Que lata!

— Mas porquê? Porquê? — questionou-se Nicolau, perturbado.

— Senhores agentes, pedimos imensa desculpa pelo transtorno – disse José. — Mas, nunca imaginei uma coisa destas e…

— Boa noite, Sr. José – interrompeu o agente. — E veja se presta mais atenção à sua esposa. Talvez assim saiba onde ela anda.

— Os senhores agentes não aceitam nada para comer, pelo vosso incómodo? – perguntou Aurora, estendendo-lhes o tabuleiro onde estavam dispostas as conservas.

— Filetes de cavala em azeite picante com pickles? Muito típico do Natal – ironizou um dos polícias.

— Também há sardinha sem espinha em molho de tomate — insistiu José, incapaz de captar o tom trocista.

— Deixe estar obrigado. Temos uma marmita com bacalhau lá na esquadra. De onde não devíamos ter saído… – disse o outro, dirigindo-se à porta.

— Eu bem disse que não devíamos ter metido a polícia ao barulho… — suspirou Estela, envergonhada pela cena.

— Boas festas senhor agente – disfarçou Tó Mané.

— Desculpe o incómodo — acrescentou Aurora, fechando a porta.

Carina veio finalmente juntar-se aos adultos.

— Então? A polícia descobriu onde a Natália está?

— Sim – respondeu Nicolau. — Aparentemente, de férias num paraíso tropical.

— Oh… — suspirou Carina. Depois pegou nas mãos do marido e perguntou: — E como é que isso te faz sentir?

— Parvo. Desatento. Um filho mau… — confessou, Nicolau, desatando a chorar no ombro da mulher.

As crianças apareceram na cozinha nesse instante, empunhando os utensílios de manejar a lareira como se fossem espadas e gritando «Mau! Mau! Mau!».

— Meninos, então? Sejam carinhosos com o papá… – pediu Carina, calmamente, continuando a acariciar a cabeça do marido.

— Larguem já isso! — ordenou José, que raramente levantava a voz aos netos.

— Era uma palmada no rabo que até andavam de lado – disse a D. Laurinda, que tinha criado filhos e netos munida de uma colher de pau.

Carina olhou para a avó do marido, chocada, e regressou à sala para consolar os filhos, que agora corriam em volta da mesa de centro atulhada de bibelôs.

Entretanto chega Gaspar. Não o Rei Mago, mas o filho mais novo de Natália e José. Era a primeira vez que trazia a namorada e a filha desta para passarem o Natal com a família, agora que viviam juntos há quase um ano. A menina escondia-se atrás da saia da mãe, que estendeu ao dono da casa um saco com um presente, cujo contorno deixava adivinhar uma garrafa.

­— Fogo, Melissa, nem acredito que logo este ano a minha mãe não está – lamentou Gaspar. —Normalmente, quando chegamos, a casa está cheia de luzes e cenas e a mesa toda posta e bué comida.

— Pois, mas agora teremos de ser nós a dar corda aos sapatos— disse Estela, revirando os olhos. — ‘Bora lá pôr a mesa.

— Eu ajudo — prontificou-se Melissa, querendo causar uma boa impressão.

— Não é essa a toalha — protestou Nicolau, quando viu a irmã abrir a gaveta da cozinha e tirar de lá uma toalha quadrada com peras bordadas nos cantos.

— E tu sabes, por acaso, onde a mãe guarda as toalhas de Natal? – perguntou Estela.

— Não é no armário do corredor? – indagou Nicolau.

— Não, totó, aí são as toalhas de banho – disse Gaspar.

— Desculpa lá, se ao contrário de ti, já saí desta casa há vários anos e não me lembro do sítio das coisas.

— Estão na gaveta de baixo do móvel da sala de jantar – explicou Gaspar.

— E os pratos, podem ser estes? – perguntou Estela, com indiferença, agarrando nos primeiros pratos que encontrou.

— Claro que não! É suposto usar o serviço de porcelana – esclareceu Nicolau, que tentava por tudo reconstituir um bocadinho do Natal como sempre o conhecera.

— E depois, ficas tu a lavar os pratos à mão, é? – atirou Estela, com sarcasmo.

— Não contem comigo, que gastei um dinheirão na manicure – informou Aurora.

— Pronto, está bem, ponham lá o serviço normal – suspirou Nicolau, vencido, dirigindo-se à despensa para ver o que mais poderia trazer para o repasto, de modo a dar-lhe um aspecto mais natalício.

— Se calhar está na hora de ligar o forno para pôr os congelados – sugeriu Estela, percebendo que era a única que tinha cabeça fria suficiente para tomar decisões.  

— Pai, como é que se liga o forno? – perguntou Gaspar.

— Eu sei lá!

— Ai, vocês também, não sabem nada – disse Aurora, desiludida. — Não admira que a minha irmã passe a vida a queixar-se. Agora vejo que afinal tem razão.

— Afinal há bacalhau – exclamou Nicolau, triunfante, saindo da despensa com várias postas entesadas nas mãos. — Agora é só cozer, não é?

— Não sei… Não é suposto deixar de molho? — questionou Estela.

— Claro que é – afirmou Aurora, abanando a cabeça.

Estava com a desagradável sensação de que ainda ia sobrar trabalho para si. Era o que faltava. Trabalhava que nem uma moura o ano inteiro, por isso, quando vinha à terra, esperava ser apaparicada como uma turista. Tinha por norma, não mexer uma palha.

— Quanto tempo de molho, uma hora? Podemos jantar só às dez – sugeriu Nicolau, que ainda não perdera a esperança de ter uma ceia como deve ser.

— Ah, isso é coisa para três ou quatro dias — assegurou a D. Laurinda, porém, ignorada por toda a gente.

— Vê no Google — sugeriu Gaspar.

— Ó pá, deixem-se disso… – disse Estela.

— Mas é importante manter a tradição – insistiu Nicolau.

— Eu comprei bacalhau – assegurou José, orgulhoso. – É congelado, mas é espiritual, que tem tudo a ver com a quadra. Já descobriram como se liga o forno?

— Vê no Google — voltou a sugerir Gaspar.

Os filhos de Aurora entraram na cozinha a fazer perguntas em alemão.

— Rafael e Frederico, já vos disse que é falta de educação falar em alemão em casa dos tios, que não percebem – ralhou a mãe.

Entshuldigung… Quer dizer, desculpa aí – disse Rafael.

— Quando é que se come? – perguntou Frederico.

— Quando vos chamarem para a mesa, ora essa – respondeu Aurora. — E já que aqui estão, levem estes pratos para a sala de jantar. Schnell, schnell!

Os dois arrastaram-se até à sala de jantar, revirando os olhos, segurando uma pilha de pratos cada um. Quem é que inventara a seca de passar o Natal com a família?

IV

A mesa estava posta como se pôde. A toalha que Natália costumava usar na consoada foi encontrada, embora ninguém se tenha dado ao trabalho de passá-la a ferro. Os pratos eram os de uso quotidiano, dois ou três com pequenas lascas, outros um pouco riscados do uso. Os copos a imitar cristal foram retirados do louceiro, o pó soprado às pressas, e colocados à frente de cada prato, se bem que quem os colocou não tivesse reparado que tinham diferentes tamanhos, ignorando quais os de água e quais os de vinho. Os guardanapos de pano foram colocados à esquerda, sim senhor, mas sem as argolas de azevinho ou o laço vermelho com que Natália cuidadosamente os apresentava. Do aparador saiu o castiçal de casquinha, porém, ninguém encontrou velas novas, pelo que usaram os cotos que tinham sobrado do ano anterior.  Nicolau pôs músicas de Natal a tocar a partir do seu telemóvel e José pediu que todos se sentassem, para dar início à refeição, apresentada em vários recipientes de alumínio acabados de sair do forno. Permaneceu de pé, para proferir um breve discurso.

— Minha querida família, este é um Natal muito diferente daquele a que estamos habituados… — lembrou, com a voz a tremer. —  Não temos o nosso bacalhau, não temos aquela mesa toda catita e não temos… a nossa querida… Natália — e desabou num choro.

Nicolau levantou-se logo para abraçar o pai e os dois ficaram agarrados, em lágrimas, perante a estupefacção da restante família, para quem não era caso para tanto.

— Gasparzinho, faz qualquer coisa — pediu Estela ao irmão mais novo.

— Podes não me chamar Gasparzinho à frente da minha namorada, se fazes favor? — sussurrou ele, levantando-se para fazer um brinde e animar as hostes. — Bom, malta, lá porque a mãe bazou de férias, não vamos deixar o espírito de Natal morrer, não é? Estamos cá nós, temos comida e bom vinho, por isso, bora lá aproveitar! Boas festas!

Estela soltou um grito de apoio, que fez com que as crianças começassem também a dar gritos, despertando José e Nicolau da sua tristeza. Rafael, que ainda estava de fones, aproveitou a distracção para começar a servir-se de lasanha antes de toda a gente e Frederico, percebendo que, dentro do copo, o vinho tinha quase a mesma cor que a Coca-cola, encheu o seu de tinto.

— Eh pá, esqueci-me do Glüwein – disse Tó Mané, dirigindo-se à cozinha, de onde trouxe, pouco depois, um jarro com o típico vinho quente com especiarias, comprado já pronto, só tivera de aquecê-lo numa panela com umas rodelas de laranja e um pau de canela.

— Não percebo por que trazem essa porcaria de vinho quando temos cá pinga tão boa – disse José, já recomposto, recusando a oferta do cunhado.

— Sei lá, porque é típico de lá da Alemanha – explicou To Mané.

— Mas aqui ninguém aqui é alemão — interveio Estela.

— Não sejas assim rapariga — protestou Aurora, olhando para a sobrinha. — Ficas a saber que o Natal na Alemanha é uma coisa lindíssima. As decorações na rua, os mercados, as montras, os docinhos…

— Olhe, então para o ano, podia fazer o Natal em sua casa. Assim ficávamos todos a conhecer – retorquiu Estela, sabendo bem que a tia nunca se meteria em tais trabalhos.

Aurora fez um sorriso amarelo e deu um gole no vinho quente que quase lhe queimou a língua.

— Se soubesse que era isto a ceia, tinha ficado no lar – suspirou D. Laurinda, remexendo na comida.

— Desculpe lá mãe, mas fizemos o que podíamos – disse José.

— Eh pá, o meu bacalhau está frio… – reclamou Nicolau.

— Cala-te e come — disse Gaspar. — Pelo menos, tens uma refeição. Já a tua mulher…

Carina era vegetariana e, de tudo o que havia na mesa, só podia comer pão e queijo. Nicolau nunca reparara que nos outros Natais a mãe, mesmo não simpatizando muito com a nora, além de lhe encher o prato com couves, cebola e ovo cozido, tinha o cuidado de cozer um bocadinho de cenoura e grão, para a ceia ficar mais composta.

— Queres que te vá fritar uns ovos? – perguntou ele à mulher, subitamente preocupado.

— Acho que não há — confessou José.

— Não é preciso. Não estou com muita fome – respondeu Carina. — E depois ainda temos a sobremesa.

— Ah! A sobremesa — exclamou Tó Mané. — Passo o ano a sonhar com isso. As rabanadas, os sonhos, as filhoses, a aletria…

— Ai, filho, e vais continuar a sonhar… – suspirou Aurora. — A não ser que a tua mãe tenha algumas sobras amanhã na casa dela.

— Temos bolo-rei — exclamou José, feliz por se ter lembrado de comprar um.

­— Ora aí está — disse Nicolau, sorrindo pela primeira vez desde que chegara — Uma fatia de bolo-rei e um cálice de vinho do Porto, isso sim, sabe a Natal.

Sem grande disposição para continuarem à mesa após tão desenxabida ceia, pelas dez da noite já todos estavam a levar a louça para a cozinha. Meteram tudo na máquina, até os copos, apesar dos protestos da D. Laurinda, mais uma vez ignorada, e foram para a sala, onde se sentaram a olhar uns para os outros, sem saberem bem o que era suposto acontecer a seguir. No telemóvel do Nicolau soava, ironicamente, Silent Night. Felizmente, as crianças mantinham a sua alegria e imploravam aos pais para abrirem alguns presentes, mesmo não sendo meia-noite. Como ninguém queria que o convívio se prolongasse por mais duas horas, decidiram aceder ao pedido sem qualquer hesitação.

A troca de presentes costumava ser um momento de grande diversão. José colocava um barrete de Pai Natal e agarrava nos embrulhos que estavam debaixo da árvore, um a um, lendo o cartãozinho que pendia dos enormes laços. Natália tinha o cuidado de embrulhar cada presente em papel comprado especialmente para o efeito. Não gostava dos embrulhos que faziam nas lojas. Além do papel, perdia tempo a escolher fitas de diferentes padrões e texturas, pequenas decorações e cartões, que escrevia à mão, um por um, e onde, em vez do nome do destinatário, se lia algo como «para uma menina que este ano perdeu dois dentes e tem um urso chamado António». De olhos arregalados, uma das netas saltava do sofá, encantada, atacando o objecto com ferocidade. Todos se riam e reviam nas charadas que Natália inventava.

Este ano, porém, ninguém encontrara o barrete e, quando José pegou no primeiro presente, todos notaram que vinha embrulhado em papel de um conhecido hipermercado, sem laço, sem cartão, apenas um nome escrito a caneta apressadamente. Era todas ofertas impessoais, compradas sem grande cuidado na prateleira das promoções de uma grande superfície. Velas, saca-rolhas, bombons, de tal modo que José se sentiu compelido a dar uma nota a cada filho para compor um bocadinho a coisa. Em todos aqueles anos nunca se preocupara com os presentes e, normalmente, nem sequer sabia o que continha cada embrulho. As ofertas eram dadas em nome dos dois, mas quase sempre uma surpresa também para ele. Só costumava comprar o presente dela e, mesmo esse, era escolhido pela filha, que, já se sabe, tem mais jeito para essas coisas. Agora entendia as listas de Natália, as idas e vindas de diferentes lojas, os telefonemas para lhe garantirem certa reserva, a azáfama constante, os cortes de papel nos dedos.

Após a brevíssima e deprimente troca de presentes, um por um, os filhos foram partindo, com desculpas várias. «Os miúdos estão com sono». «Amanhã cedo temos de deixar a Luana no pai». «Ainda tenho muito que fazer antes do fecho do ano». Todos os outros iam dormir na casa, mas depressa desapareceram também. Os sobrinhos foram continuar os seus afazeres cibernéticos no quarto que fora de Gaspar. Os cunhados apressaram-se a recolher ao quarto que tinha sido de Nicolau. A D. Laurinda já se estava a ver no quarto de Estela, mas, infelizmente, precisava de ajuda para se levantar do sofá, pelo que teve de aguentar ali mais um bocado. Olhava para o ecrã da televisão sem ver nada, cheia de sono, mas sem coragem para pedir ajuda ao filho, coitadinho, que está tão triste e precisa de companhia. Debaixo da árvore de Natal, restava um único embrulho. Um perfume para Natália, trazido por Estela.

— Mas porque é que ela nos fez isto? – perguntou José, olhando para a caixa de Ferrero Rocher que lhe tinha calhado. – Se era uma partida, não teve graça nenhuma.

— Acho que a Natália não quis pregar uma partida. – disse D. Laurinda. — Quis apenas dar-vos uma lição.

José olhou para a mãe espantado e sentiu cair-lhe a ficha. Depois, enfiou três bombons ao mesmo tempo na boca e ficou a olhar para o lume, que aos poucos se extinguia.

— Ao menos dá-me um também – reclamou D. Laurinda, estendendo o braço para a caixa dourada.

Além do assobio da lenha incandescente, o silêncio da noite foi apenas quebrado pelo mastigar de mãe e filho e o amachucar do papel de vinte e quatro Ferrero Rocher.

Epílogo

Manhã de Natal.

O sol entra por uma fresta da cortina mal fechada e reflecte na tijoleira, banhando o quarto com uma luz cor de âmbar. O vento acaricia as folhas das palmeiras provocando um murmúrio parecido com chuva ligeira. Natália desperta e sorri ainda antes de abrir os olhos. Nem nos seus sonhos mais fantasiosos imaginou que pudesse trocar o roupão de flanela e as pantufas de lã de ovelha por um fato de banho no dia de Natal. Levanta-se e dirige-se à varanda para confirmar que não se trata de um sonho. A seus pés estende-se o mar turquesa e a areia branca arrancando-lhe uma gargalhada. Bendita a hora em que decidira juntar umas poupanças para este seu devaneio.

Há vários anos que vinha ponderando fugir do Natal em família, cansada da escravidão em que a quadra se tornara. Há vários anos que vinha prometendo a si própria que não faria nada no ano seguinte, que já não tinha idade para aquilo. Mas depois, acobardava-se. Temia não aguentar as saudades e passar a consoada sozinha a uma mesa de hotel.  Este ano, porém, tivera a coragem de descobrir que as saudades não pesavam assim tanto e nunca lhe faltou companhia entre centenas de hóspedes de um resort tudo-incluído. Quanto às tradições de Natal que tanto apreciava, elas também existiam naquela ilha quente das Caraíbas. Havia música, dançarinos, um porco assado no espeto e outras iguarias natalícias dominicanas. Havia gorros de Pai Natal na cabeça de todos os funcionários e fogo-de-artifício na praia. Havia cocktails em tons de vermelhos e outros em tom de verde e neve artificial à entrada do salão de festa. Havia um baile que durou até às duas da manhã. E agora, na manhã de dia vinte e cinco, todo aquele azul, todo aquele calor e um buffet especial à sua espera junto à piscina principal.

Depois de se banquetear e de se abanicar ao som dos Aguinaldos, Natália foi estender-se numa espreguiçadeira na praia, saboreando um Mojito feito com xarope de hortelã e rum dominicano, e sentiu-se dez anos mais nova. Pela primeira vez na vida, estava a desfrutar verdadeiramente da sua época preferida do ano. Dez dias sem entrar numa cozinha, sem levantar um prato, sem se aproximar de uma garrafa de detergente. Dez dias sem ouvir perguntas, queixinhas e discussões. Naquele ano, decidira pensar primeiro em si e oferecer-se um presente de Natal. E se aquele não era o melhor presente de sempre, não imaginava qual poderia ser.

Este conto faz parte do livro «Nove contos (não) tradicionais de Natal», iniciativa da editora SUMA de Letras, cujas receitas revertem 100% para a Comunidade Vida e Paz.

3 opiniões sobre “O Presente de Natália

  1. Obrigado, Filipa, por este inesperado presente de Natal (o meu unico presente). Adorei pois como já lhe disse não tenho recursos para comprar livros e tenho de aproveitar o que vai aparecendo na Net. Coloquei-me no lugar da Natália e do José. Como eu os compreendo. Como sabe tenho 79 anos e os meus filhos e netos no estrangeiro. Assim, passo o Natal só. A sua história foi o meu presente de Natal. Tenha Boas Festas e om Natal Feliz para a sua familia.

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    1. Caro Manuel,

      Fico feliz por as minhas palavras lhe trazerem um pouco de alegria natalícia nesta quadra. Desejo-lhe um Natal feliz, apesar de não poder estar com a sua família.

      Aproveito para lhe deixar um link com várias bibliotecas digitais gratuitas. La encontrará um enorme acervo de obras literárias, para que nunca lhe faltem livros! Espero que goste.

      https://lisboasecreta.co/bibliotecas-digitais-livros-gratuitos/

      Um beijinho

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