
A deputada recém eleita do Livre tem sido a grande vedeta política da semana, pelas piores razões. No entanto, não venho aqui deitar achas para a fogueira sobre as polémicas que têm alimentado os jornalistas e regozijado os seus opositores. Do que quero falar é da sua gaguez.
Sem medo de ferir susceptibilidades, assumo a minha posição: Joacine podia ser tudo na vida, excepto deputada. Bom, talvez também não devesse ser actriz ou locutora de rádio, simplesmente pelo facto de ser impossível entender o que ela diz.
No outro dia, estava a ouvir o debate do Parlamento no exacto momento em que Ferro Rodrigues deu palavra à deputada do Livre. Estava sinal vermelho e, por acaso, olhei para o relógio. Eram 17.06h. Quando cheguei à porta do colégio dos meus filhos eram 17.09h. Em cerca de três minutos, Joacine conseguiu dizer pouco mais do que isto: «Pergunto-lhe Sr. primeiro Ministro, se para aumentar a natalidade, em vez de dar sessenta euros pelo segundo filho, não era mais óbvio e um verdadeiro incentivo se existisse um aumento efetivo do salário mínimo nacional para os 900 euros até ao final desta legislatura?». Estive a cronometrar o tempo que eu levo a dizer a mesma frase, falando muito pausadamente, e quase não chega a trinta segundos. Porém, não foi só o tempo que levou a dizer a frase. Foi o esforço que tive de fazer para seguir o seu raciocínio. Ainda para mais a guiar. Cada vez que conseguia perceber uma palavra, quase me tinha esquecido da frase precedente.
Não estou a tentar ter graça, nem escrevo este texto com qualquer tipo de ironia ou gozo. A sério que estou solidária com a sua dificuldade de expressão e achei inspirador ouvi-la dizer ao Ricardo Araújo Pereira que é gaga a falar, mas não a pensar. Como feminista, fiquei feliz por termos mais uma mulher no Parlamento e sou totalmente a favor da integração de qualquer minoria na sociedade. Não acho justo que se descarte uma pessoa que poderia dar um contributo válido, seja em que área for, só por ser de determinada etnia ou por ter determinada deficiência. Desde que isso não prejudique a função que desempenha. Mas no caso da Joacine, prejudica.
Lembro-me de ter ficado indignada quando descobri que a maioria das companhias aéreas não admitiam pessoas com menos de um metro e sessenta para assistente de bordo. Eu tenho um metro e cinquenta e três e odeio que me digam que não posso fazer alguma coisa. Achei um perfeito disparate e uma discriminação profunda de todos nós, pequeninos. Até ao dia em que andei num avião e me vi aflita para colocar a mala na bagageira. Ou quando, no fim do voo, tive de colocar os pés no assento para retirar o casaco que tinha ficado no fundo da mesma. Aí percebi o porquê de haver um mínimo de altura e a minha indignação quase me envergonhou. Como esta, há inúmeras profissões que determinadas pessoas, mesmo que vivêssemos numa sociedade seja justa e perfeita, nunca poderiam ter. Um médico com uma paralisia numa mão, não pode ser cirurgião. Uma mulher que sofra de acne não será a candidata ideal para consultora de beleza. Um cego não tentará, com certeza, ser árbitro de futebol. Temos pena. Não tem nada que ver com intolerância ou desigualdade. Tem que ver com bom senso. A começar no bom senso da própria pessoa, que deve reconhecer as suas limitações e não insistir em seguir um caminho que lhe estará, muito provavelmente, vedado.
Se calhar, a Joacine não previu que estar num parlamento requer diálogo e ataques. Se calhar, nunca tinha estado sob as luzes dos holofotes, a ser pressionada e escrutinada pelos Media, e achou que ia conseguir controlar os nervos (uma pessoa quanto mais nervosa está mais gagueja). Ou talvez esteja tão habituada à sua gaguez e a superar admiravelmente tantos desafios, que não o tenha considerado um impedimento. Não sei. Isto sou eu a tentar imaginar cenários em que uma pessoa com gaguez extrema ache boa ideia ser deputada. Só que a verdade é que a sua gaguez, sendo a única deputada do partido que representa, é um problema. A sua gaguez, perante um potencial eleitorado a quem tem de passar uma mensagem, é um problema. E parece que anda toda a gente a fingir que não, só para ficar bem na fotografia. Então eu pergunto-me: será isto aproveitamento político ou é a imposição absoluta do politicamente correcto?
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