Ninguém quebra o MAI

É dia de festa para os sportinguistas. Finalmente um título de campeão e bem merecido. Não fico feliz pelo clube, porque o meu benfiquismo me impede, mas fico genuinamente feliz pela minha mãe, pelo meu sogro, por tantos amigos queridos e os seus filhos, alguns já adolescentes, que nunca tinham visto o seu clube ganhar. Eu, que já festejei seis títulos com o meu filho e ele ainda só tem nove anos, fico sensibilizada com essas coisas. Por isso, parabéns pelo título.

Posta esta ressalva e picardias clubísticas à parte, vamos então malhar nos festejos de ontem.

  1. Aos sportinguistas que foram para a rua: imagino o quão difícil deve ser conter a alegria de quem esperou quase duas décadas para se expressar. Que injustiça este acontecimento raro ter calhado logo numa altura de pandemia! Mas sabem o que também é injusto? As pessoas que não se puderam despedir dos pais no leito da morte, nem abraçar os filhos acabados de nascer. As noivas que tiveram de adiar casamentos e que agora já não têm o pai para as levar ao altar. Os empresários da noite falidos. O pessoal dos espetáculos que agora virou caixa de supermercado. As grávidas de risco, semanas sozinhas numa cama sem qualquer visita. Os médicos e enfermeiros e auxiliares que viveram a tragédia de Janeiro e Fevereiro, parece que foi ontem, menos para os milhares que se amontoaram ontem, sem máscara, sem qualquer tipo de cuidado, sem respeito pelas 16 mil vidas que se perderam em pouco mais de um ano. Podiam ter festejado e gritado à janela, com um restrito grupo de amigos, talvez até dentro do carro a buzinar. Mas não. Tinham de ir para a rua. Porque afinal é o futebol e neste país pequenino, o futebol é quem mais ordena.
  2. Ao Sporting Clube de Portugal: podiam ter sido responsáveis, para mais tendo um médico como presidente. Podiam ter organizado uma festa para ser transmitida em directo nas redes sociais e podiam ter pedido oficialmente aos adeptos para não saírem à rua. Claro que isso não impediria que muitos saíssem na mesma, mas ao menos o clube teria dado um bom exemplo. Um exemplo responsável. Mas não. Pelo contrário, puseram ecrãs gigantes a transmitir o jogo dando mais uma razão aos adeptos para não arredarem pé. E ainda foram fazer a voltinha de autocarro, para saudar os outros que se juntaram no Marquês. Bravo.
  3. À Câmara Municipal de Lisboa: que autorizou o ecrã gigante e o passeio de autocarro. Claro, há autárquicas à porta, há que deixar os munícipes felizes. Não pode haver Marchas Populares na Avenida da Liberdade, nem arraiais, nem coisa nenhuma, mas não há problema em haver festejos clubísticos. Foram surpreendidos pelas multidões na rua? Não têm responsabilidade nos eventos de ontem? Ou não têm apenas vergonha na cara? Onde está o sorridente Medina hoje?
  4. Ao Ministro da Administração Interna: quando é que vai andando, agora a sério? Ele é golas anti-fumo inflamáveis e problemas com o SIRESP, ele é tortura no SEF, ele é voto antecipado caótico, ele é escravatura na agricultura e acções de controlo anunciadas dias antes que é para que os criminosos tenham tempo de se esconder, ele é requisições civis. Agora é uma festa que estava a ser preparada, segundo disse o secretário de estado do Desporto na semana passada. «Está a ser preparada, tive oportunidade já esta semana de falar com responsáveis do Ministério da Administração Interna e hoje mesmo decorre uma reunião entre a Câmara Municipal de Lisboa, um potencial vencedor do campeonato e as forças de segurança.» E no entanto, as pessoas começaram a juntar-se depois de almoço, houve venda ilegal de bebidas alcoólicas, a PSP deu uma conferência de imprensa patética e paternalista a meio da tarde enquanto continuou a deixar os adeptos acumularem-se junto ao estádio quando já era tarde de mais. Tarde de mais será o dia em que o Ministro mais incompetente de que tenho memória se for embora. Medíocre, irresponsável, sem um pingo de decência ou de sentido de Estado. Fico incrédula com protecção cega que António Costa continua a dar-lhe. Por outro lado, acaba por ser a imagem deste Governo cego, surdo e mudo a tudo o que ponha em cheque a grande família socialista.

O Sporting quebrou ontem o jejum, mas aparentemente ninguém quebra o Ministro da Administração Interna.

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