Tenho um amor platónico pelo Chico Buarque desde a adolescência. Não só a sua música faz parte da banda sonora da minha vida inteira (obrigada, pais!), como as suas letras, verdadeiros poemas, dos mais bonitos que alguma vez foram escritos na Língua Portuguesa, me deixam rendida de cada vez que os oiço ou leio. Todos. Sem excepção.
O Chico, e peço desculpa pelo tratamento informal, mas para mim é como um velho amigo da família que andou comigo ao colo desde menina, tem a mestria de contar histórias que davam livros em meia dúzia de estrofes. Um dom que muito poucos possuem. Ao ouvir uma música/poema do Chico, podemos fechar os olhos e conhecer em detalhe cada personagem, como é, o que sente, onde está, a que cheira, coisas que, num livro, um escritor só consegue fazer em vários parágrafos, por vezes capítulos.
Como se não bastasse o talento tremendo para a poesia, o Chico escreve prosa brilhantemente. Ficou claro pra mim quando li o “Estorvo” na adolescência, provado com a leitura de “Budapeste” e “Leite Derramado” e comprovado com “O irmão Alemão”. Ler o Chico faz-me entrar num estado de admiração embevecida, ligeiramente infantil, com alguma inveja pelo meio. Como é possível alguém escrever assim, em qualquer género literário, e ainda compor, ter aquela voz e aqueles olhos azuis!?! (Ah aquela voz… Fora ele bem mais novo ou eu bem mais velha, que parecendo que não, 35 anos nos separam, e lá ia o platónico por água abaixo.)
Ontem o meu Chico ganhou o Prémio Camões. O que não me surpreendeu mesmo nada. Foi quase uma não notícia. Porque para mim, é tão óbvio que ele é um dos maiores escritores da Língua Portuguesa, é tão obvio que não há muitos escritores que dominem uma língua como ele, que só me admira terem levado tanto tempo a reconhece-lo. E terem dado o Nobel ao Bob Dylan. Chico, meu Chico, meu amor. Parabéns.
Filipa Fonseca Silva 