Schadenfreude

Finalmente tenho uma palavra para designar uma condição de que padeço há muito. Foi uma sensação de alívio perceber que, afinal, é bastante comum e que, a partir de agora, tenho um vocábulo para responder aos olhares de espanto dos outros. É que é muito difícil conviver com o que sentimos quando não sabemos designá-lo. Por exemplo, o choro é uma reacção física a emoções diferentes, do medo à frustração, da dor à vergonha. Há que verbalizar usando o vocabulário correcto, como a Psicologia tem defendido. Ou, por outras palavras mais corriqueiras, é importante  saber chamar os bois pelos nomes.

Pois schadenfreude, descobri recentemente, é um sentimento de alegria maliciosa experimentada diante do dano ou infortúnio sofrido por um terceiro. Também no grego antigo existe a palavra epichairekakia, provando que é algo que já está identificado há vários séculos, e ao contrário do que muitos dizem, não revela nada acerca do povo alemão, mas antes acerca da natureza humana. Sendo o grego antigo uma língua morta, prefiro usar a palavra alemã.

Há vários exemplos de schadenfreude, e atire já a primeira pedra quem nunca a sentiu. Podemos senti-la quando o chefe que nos fez a vida negra é despedido, ou quando o chico-esperto que está a tentar ultrapassar toda a gente pela berma é mandado parar pela polícia. Mas também podemos senti-la, como no meu caso, quando vemos alguém a cair. 

Se alguém cai à minha frente sinto um misto de schadenfreude e preocupação. Fico genuinamente preocupada que a pessoa se tenha magoado, e corro para ajudá-la, claro, mas assim que percebo que está bem, desato a rir. E não pensem que isto acontece apenas com estranhos que vão contra uma porta de vidro ou tropeçam no passeio. Eu não consigo controlar-me mesmo quando quem está a estatelar-se à minha frente é um dos meus filhos. Sabem aquelas mães que quando a sua criança cai vão logo a correr de mãos na cabeça e coração na boca? Não sou eu. Eu costumo mais ir com as mãos na boca para impedir a gargalhada de se soltar, enquanto o meu marido me dá na cabeça e me diz que sou doente. A frase mais comum que ouço dos meus filhos quando caem é «ó mãe, não te rias».

Mas esperem. A minha condição é tão grave que quando eu própria caio, fico no chão a rir e só depois tenho forças para me levantar. Mais: a minha condição permite-me rir sem presenciar a cena! Se alguém me conta que caiu ou viu alguém a cair, eu consigo visualizar tudo com tal precisão que desato a rir à gargalhada.

Durante anos senti-me envergonhada por esta falta de controlo. Só o meu pai e a minha irmã me compreendem porque são iguais. Agora fico mais descansada por saber que não estou sozinha. Schopenhauer disse que «é diabólico experimentar Schadenfreude». Schopenhauer não tinha qualquer sentido de humor.