É difícil alguém ter preocupações ambientais quando, no dia-a-dia, se luta para viver. Ou, melhor dizendo, quando, por este mundo fora, a maioria das pessoas nem sequer vive: sobrevive. Sobrevive para pagar as contas, para educar os filhos, para pôr comida na mesa… Só que hoje, caros amigos, as preocupações ambientais já não são uma questão que diga respeito apenas às elites informadas, aos neo-hippies ou aos partidos verdes. São uma questão de sobrevivência da espécie. Da nossa espécie.
Sei que muitos estão neste momento a suspirar “que exagero”, “que disparate”, “quem manda é que tem de se preocupar com isso”, “até o mundo chegar a tanto, já a ciência descobriu uma maneira de nos salvar” e outras frases que tais, numa atitude de autoconvencimento de que tudo vai correr bem. Conseguimos dormir melhor à noite quando colocamos a responsabilidade de resolver os grandes problemas nos outros. Nos cientistas, nos políticos, nos governantes, nos donos das empresas, enquanto continuamos a levar as nossas vidinhas e a carregar as nossas preocupações mundanas. O colega lambe-botas, o marido desinteressado, os filhos ingratos, a vizinha invejosa, o carro novo, o destino de férias, a consulta adiada, a operação do avô, a reunião decisiva, tenho lá tempo para me preocupar com a devastação da Amazonia ou as cheias no Bangladesh!
Porém, são precisamente os cientistas a dizerem que se não agirmos já, agora, hoje, sem mais demora, não haverá ciência capaz de nos salvar. De nos salvar, a nós, seres humanos, já que o planeta e variadíssimas espécies que o povoam continuarão por cá, aliviados certamente por, ao fim de tantos milénios, se livrarem da espécie mais mortífera de todas. Ou seja, neste momento, as preocupações ambientais são bem mais do que uma questão de sobrevivência. São a única questão.
Posto isto, vejo hoje o mundo dividido entre os que sabem que vamos todos morrer se não lutarmos pelo ambiente, e os que continuam preocupados em manter tudo como está, sobretudo se se encontram naquela ínfima percentagem da população que lucra com o petróleo, o gás, o gado ou o plástico, ou, não lucrando, pelo menos não está disposta a desviar um milímetro o seu estilo de vida ou os seus hábitos de consumo. Um pouco como no enredo da série «A Guerra dos Tronos».
Para quem não seguiu a melhor série de sempre (salvo as últimas duas temporadas, admito), a história é sobre a luta pelo Trono de Ferro, disputado entre várias casas reais, cada uma com as suas razões para almejar o poder supremo. Enquanto as lutas pelo poder atingem proporções épicas, algumas pessoas, lideradas pelo herói Jon Snow, sabem que há uma ameaça mortal do outro lado da Muralha que protege os sete reinos e que, a única coisa a fazer, é juntarem-se todos para a travar, independentemente das pretensões, ideologias ou ódios de estimação de cada um. Bem vêem como esta analogia é perfeita para o exposto no início deste texto, certo? Então, quem está consciente de que a única salvação da humanidade é proteger o planeta são os Jon Snows. Os outros são Lannisters, pessoas mesquinhas, que preferem continuar a sua luta pelo poder do que garantir a sobrevivência de todos.
O aquecimento global está a provocar desastres naturais nos quatro cantos do mundo. As ondas de calor são cada vez mais frequentes e mortíferas, a cadeia alimentar já está irremediavelmente contaminada com microplástico, os lençóis freáticos com químicos, o ar com centenas de gases nocivos. Os glaciares estão a derreter, os solos estão a perder as suas propriedades, centenas de espécies desaparecem a cada ano que passa. Acreditem, o Inverno está mesmo a chegar. E é agora, nos próximos três ou quatro anos que temos de agir. E exigir.
Não é fácil mudar de hábitos, bem sei. É complicado não esquecer de andar sempre com uma garrafa de reutilizável e um saco de pano; embrulhar as sanduíches do lanche dos miúdos em papel; escapar à tentação de fazer aquela viagem só porque o bilhete é lowcost, ou comprar aquele vestido, aqueles ténis, aquele telemóvel que está com um preço incrível; mudar para um dieta maioritariamente vegetariana; preferir fruta da época em vez de ceder ao capricho de comer morangos em Dezembro; largar o carro; boicotar empresas que não estejam empenhadas na sustentabilidade; remendar a roupa em vez de deitar fora. Toda a gente gostava de salvar o mundo, desde que, na prática, isso não signifique mudar a maneira como gostam de viver.
Só que chegámos a um ponto em que não há alternativa. Já passámos o tempo de debater se vale mesmo a pena deixar de comer carne, plantar mais árvores ou abraçar qualquer uma das medidas sugeridas neste texto. Temos mesmo todos de mudar o chip, de ser mais activos na nossa comunidade, mais exigentes com quem nos governa. É esmagador pensar que o mundo depende de nós. Achamos sempre que não somos ninguém para travar quem tudo pode. Mas somos. Somos muitos. Somos a maioria. Somos quem vota. Somos quem compra. Somos quem escolhe. Somos quem educa. Façamo-nos ouvir!
Porque neste momento estamos em guerra, não tenham dúvidas. Uma guerra sem precedentes. Uma verdadeira guerra mundial. E é agora que se tem de escolher um lado. Eu já escolhi o meu. Tal como alguns dos personagens da série acima mencionada, “I fight for the living”.
Deixe um comentário