Viajar é um privilégio subvalorizado. Talvez porque hoje há incontáveis destinos low cost ao nosso alcance. Talvez porque a televisão e as redes sociais criam uma ilusão de proximidade com lugares distantes, a ponto de parecer que já os conhecemos. A verdade é que só quando chego a um sítio remoto me relembro do quão incrível é descobrir mais um pedacinho do mundo, e o quão privilegiada sou por poder fazê-lo.
Para mim, viajar nunca foi só coleccionar lugares e colocar displicentemente um pin no mapa. Por isso, escolho destinos que me ofereçam mais do que aquilo que se pode encontrar num resort tudo-incluído, mesmo quando fico alojada num. No ano passado viajei até à Costa Rica. Este ano o destino foi o Senegal.
Já tinha estado diversas vezes em África, mas apenas nos países do norte: Egipto, Marrocos e Tunísia. Foi a primeira vez que estive na África negra e agreste, dos batuques e dos baobás, das danças vibrantes e dos sorrisos rasgados. Descobri um país muito orgulhoso das suas raízes e sem complexos com a história brutal da escravatura. A Ilha de Gorée, o ponto de partida dos infames navios negreiros, é um lugar pesado, onde a história é contada sem eufemismos, mas também sem ideologias. Nenhum senegalês com que conversei tem um discurso de vitimização. Vivem no presente, felizes por serem um dos países mais seguros de um continente em permanente sobressalto; por serem um país de maioria muçulmana, mas onde todos os credos são aceites e é possível casar com pessoas de religião diferente; por viverem numa democracia plena e que tem vindo a crescer economicamente de forma sustentada. Vivem com um sorriso nos lábios, pelo menos para nós, turistas, que acolhem com simpatia.
Claro que é um país pobre, que subsiste sobretudo da agricultura e da pesca, que tem uma população jovem, mas que não tem ensino público. Isto aniquila as oportunidades de aqueles cujos pais não conseguem pagar uma escola privada. Aqui, como em tantos lugares, os pobres serão sempre pobres. Há escolas corânicas, onde supostamente ensinam as crianças mais desfavorecidas em troca de os porem a pedir esmola na rua com um pequeno balde de plástico.
As histórias ainda são contadas oralmente, e os artistas não eram lá muito bem vistos na sociedade. Aliás, até à independência, em 1960, não podiam ser enterrados. Os seus corpos eram depositados nos troncos ocos dos baobás, pois a terra era apenas para quem a trabalhava. Quando esta prática foi abolida, houve uma seca severa durante alguns anos. Alguns acreditavam que era a terra em protesto por ter de os acolher.
Mais do que as paisagens, ou os monumentos, gosto de recolher pequenas histórias como esta nas minhas viagens. Histórias que me são contadas pelas gentes locais, com quem faço questão de conversar. Por vezes, conheço pessoas que gostaria de um dia rever. Desta vez, conheci o Bamba, um dos chefes do pequeno mercado de artesanatos montado numa das extremidades do hotel. Tem 5 filhos e prometeu levar-nos à sua aldeia quando voltarmos àquelas paragens. Regresso a casa com a alma cheia e a certeza de que quero fazê-lo.

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