As Jornadas da Juventude estão à porta e com elas chegam a Portugal milhares de peregrinos e crentes de todo o mundo. O Estado e as Câmaras abrem os cordões à bolsa, pagam a consultores e a organizadores a peso de ouro, constroem palcos que ficarão para ali ao Deus dará, e as pessoas que vivem e trabalham em Lisboa fecham-se em casa para não terem de lidar com o caos que se viverá no trânsito em geral e nos transportes em particular, de preferência abastecidos de supermercado antecipadamente.
Quando se soube o preço exorbitante a pagar por este evento, o qual só trará alegria aos católicos, os responsáveis pela propaganda atiraram logo números em todas as direcções. Que são um milhão de pessoas a consumir, a pernoitar, a circular, que isso é óptimo para a economia e para a imagem do país, mesmo que este já esteja a deitar estrangeiros pelas costuras todos os meses do ano, incluindo os que, entretanto, se mudaram para cá.
No entanto, a verdade é que os hotéis em Lisboa estão a 50% da sua capacidade, as lojas por onde passei no Chiado este fim-de-semana estavam vazias e os milhares de portugueses que diariamente circulam e consomem na cidade vão ficar em teletrabalho ou tiraram férias para fugir daqui durante essa semana infernal. Há consultas desmarcadas, há empresas a ter de adaptar e limitar a actividade por estarem localizadas no olho do furacão, enfim, há de tudo menos o tal dinheiro prometido, que de prestígio não vivem os homens, é preciso comer. E por falar em comer, basicamente, quem vai lucrar com as jornadas da juventude, além da Igreja, serão mesmo os donos dos supermercados, que vão poder funcionar 24 horas por dia, amén. E as empresas de souvenirs, vá.
É que as pessoas que vêm para as Jornadas da Juventude não são as mesmas que vêm para eventos como o WebSummit, por exemplo. Não são donos de unicórnios, nem empresários tecnológicos, nem celebridades da internet. Não vêm de Silicon Valley, nem de Hubs criativos espalhados por esse mundo fora, não vão ficar alojados em hotéis, não vão jantar nos restaurantes, não vão fazer compras no Chiado nem na Avenida da Liberdade, não vão andar de táxi nem alugar carros, não vão beber cocktails nos rooftops e muito menos ficar mais uns dias para conhecer outras cidades, pernoitar em outros hotéis, enfim, gastar dinheiro a sério. São jovens, muitos ainda nem sequer trabalham, vêm predispostos a acampar ou a ficar no sofá de alguma família de acolhimento, têm os tostões contados e quando muito vão comprar um íman para o frigorífico ou uma t-shirt com a fotografia do papa. Estima-se que tenham uma média de 40 euros para gastar por dia, o que não será feito certamente em lojas e restaurantes, museus e outros serviços. E até há uns pacotes oficiais peregrino a 365 euros vendidos pela Santa Igreja, com direito a acampamento, comida em restaurantes fast-food, transportes públicos e brindes, mas sem direito a factura, ou seja, nem impostos o Estado vai receber.
Mas nós, lisboetas, teremos ali um maravilhoso palco para futuros eventos grandiosos, ninguém sabe ainda quais, e uma ponte muito bonita sobre o rio Trancão. O resto dos portugueses, cujos impostos também contribuíram para este devaneio, também têm, para usufruírem quando puderem visitar a capital.

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